Sarah Yang - 14/08/2008
Dois avanços no desenvolvimento de metamateriais - materiais artificiais com capacidade de curvar as ondas eletromagnéticas - estão sendo publicados separadamente nesta semana, o primeiro no dia 13, em antecipação à publicação do exemplar de agosto da revista Nature, e o segundo no exemplar desta sexta-feira da revista Science.
Aplicações menos visíveis
Os cientistas, pela primeira vez, conseguiram fabricar materiais 3-D que conseguem reverter a direção natural da luz visível e da luz na faixa do infravermelho próximo.
O desenvolvimento poderá abrir novos caminhos para microscópios de altíssima resolução, nanocircuitos para supercomputadores e, para deleite dos entusiastas da ficção científica e da fantasia, mecanismos de invisibilidade, capazes de tornar objetos invisíveis ao olho humano.
Índice de refração negativo
Uma característica-chave dos metamateriais é que eles possuem um índice de refração negativo, curvando a luz de forma inversa ao que acontece em todos os materiais naturais, que possuem índices positivos de refração.
Imagine uma colher inclinada, parcialmente mergulhada em um copo com água. A parte submersa da colher parece inclinar-se no sentido da superfície da água. Se a água tivesse um índice de refração negativo, a porção submersa da colher apareceria saltando para fora da superfície da água.
Ou, para dar outro exemplo, um peixe que estivesse nadando nessa hipotética água com índice de refração negativo apareceria como se ele estivesse se movendo no ar, flutuando sobre a superfície da água.
Metamateriais 3-D
Outros pesquisadores já haviam construído metamateriais 3-D com índices de refração negativos, mas que são sensíveis apenas à faixa de freqüência das microondas e não nas chamadas freqüências ópticas.
Os humanos vêm o mundo através de uma estreita banda de radiação eletromagnética conhecida como luz visível, com comprimentos de onda entre 400 nanômetros (luz violeta) e 700 nanômetros (luz vermelha). O comprimento de onda da luz infravermelha é maior, variando entre 750 nanômetros até 1 milímetro.
Dobrando a luz
"O que nós fizemos foi adotar duas abordagens totalmente diferentes para vencer o desafio de criar metamateriais volumosos que apresentem índice de refração negativo em freqüências ópticas," diz o professor Xiang Zhang, coordenador da equipe de pesquisadores da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos. "Os dois nos deixam um passo mais próximos do desenvolvimento de aplicações práticas para os metamateriais."
Para que um metamaterial tenha índice negativo de refração, sua rede estrutural deve ser menor do que o comprimento de onda da faixa específica do espectro eletromagnético no qual ele deve funcionar. É por isso que os primeiros metamateriais funcionam com as microondas, que possuem comprimentos de onda entre 1 milímetro até 30 centímetros, o que os torna muito mais fáceis de serem fabricados.
Metamaterial com estrutura de rede de pesca
No artigo publicado na Nature, os pesquisadores relatam a fabricação de camadas alternadas de prata (condutor) e fluoreto de magnésio (não-condutor), recortadas com detalhes em nanoescala para formar uma estrutura parecida com uma rede de pesca. O índice de refração negativo foi verificado em comprimentos de onda de até 1.500 nanômetros - na faixa do infravermelho, portanto.
Jason Valentine, um dos autores do artigo da Nature, explica que cada par de camada condutora e não-condutora forma um circuito fechado. Empilhando as camadas alternadamente, cria-se uma série de circuitos que respondem de forma oposta ao campo magnético da luz que atinge o material.
"Materiais naturais não respondem ao campo magnético da luz, mas o metamaterial que nós criamos responde," diz Valentine. "Ele é o primeiro material tridimensional que pode ser descrito como tendo magnetismo óptico, de forma que os campos elétrico e magnético em uma onda de luz movem-se para trás no material."
Metamaterial com nanofios
O metamaterial descrito no artigo da Science utiliza outra abordagem para virar a luz ao contrário. Ele é composto de nanofios de prata crescidos no interior de um óxido de alumínio poroso. Embora a estrutura seja 10 vezes mais fina do que uma folha de papel, ele é considerado um metamaterial espesso porque ele tem mais do que 10 vezes o tamanho do comprimento da onda de luz.
Os autores do artigo afirmam terem observado um índice de refração negativo para a luz vermelha, com comprimentos de onda de apenas 660 nanômetros. Esta é a primeira demonstração de um material bruto capaz de dobrar a luz visível ao contrário.
"A geometria dos nanofios verticais, que estão paralelos e eqüidistantes uns em relação aos outros, foram projetados para responder apenas ao campo elétrico das ondas de luz," explica o pesquisador Jie Yao. A inovação nesse material, afirmam os pesquisadores, é que ele inclina a luz para trás sem tecnicamente possuir um índice negativo de refração.
Aplicações práticas dos metamateriais
O maior benefício de se ter um material com índice de refração verdadeiramente negativo, como o relatado no artigo da Nature, é que torna-se possível melhorar dramaticamente o desempenho dos mais diversos tipos de antenas, por meio da redução da interferência.
Materiais com índice de refração negativo também são capazes de inverter o efeito Doppler - um fenômeno físico utilizado nos radares policiais para monitoramento da velocidade dos veículos - fazendo com que a freqüência das ondas diminua ao invés de aumentar com a aproximação.
Mantos de invisibilidade
Já para a aplicação mais famosa dos metamateriais, o desenvolvimento de dispositivos de invisibilidade, tanto o material em formato de rede de pesca quando o material à base de nanofios podem potencialmente ser úteis.
Embora os pesquisadores comemorem esses novos desenvolvimentos dos metamateriais em comprimentos de onda ópticos, eles também alertam que continuamos muito longe de conseguir construir mantos da invisibilidade e outras aplicações que capturam a imaginação.
Por exemplo, ao contrário do manto da invisibilidade tornado famoso nos filmes de Harry Potter, os metamateriais descritos aqui são feitos de metal e são extremamente frágeis. Desenvolver uma forma de fabricar esses materiais em larga escala também será um desafio, afirmam eles.