Com informações da Agência Fapesp - 15/08/2014
Astrônomos brasileiros estão propondo uma explicação para as radiações de altas frequências produzidas pelas explosões solares com base em processo físico observado nos aceleradores de partículas construídos pelo homem - existem também aceleradores de partículas naturais.
Pierre Kaufmann, Jean-Pierre Raulin e Sérgio Szpiegel, os três da Universidade Presbiteriana Mackenzie, fazem parte da equipe autora da proposta.
Eles se baseiam em uma simulação computacional que tomou como base processos físicos ocorridos nos aceleradores de partículas ocorreriam obedecendo aos parâmetros existentes no Sol.
"Os resultados mostraram-se muito convincentes. Foi um dos raros casos em que a simulação de plasmas espaciais a partir dos plasmas de laboratório resultou bem-sucedida", disse Kaufmann.
Radiação síncrotron coerente
O processo físico em questão é o da radiação síncrotron coerente, que pode ocorrer quando feixes de elétrons são acelerados até atingir velocidades próximas à da luz.
Essa radiação é produzida ao mesmo tempo que a bem conhecida radiação síncrotron incoerente, gerada pelos mesmos feixes, e depende da interação dos elétrons com os campos magnéticos.
Se as ondas que descrevem os elétrons ficam em coerência de fase, ao liberarem energia todos os elétrons o fazem ao mesmo tempo. É isso que constitui a radiação síncrotron coerente, caracterizada pela emissão de pulsos de energia de altíssima intensidade.
"Nos aceleradores, as partículas são aceleradas artificialmente por meio de campos magnéticos. No Sol, o processo está associado às manchas solares, que são polos magnéticos", explicou o pesquisador do Mackenzie.
"Há um grande confinamento de partículas na região situada acima da mancha, na atmosfera solar. Tipicamente, esse confinamento tende a desaparecer em até dois meses terrestres, que é o tempo de duração das manchas solares, balizado pelo período de rotação do Sol", afirmou Kaufmann.
"Por causa de algum mecanismo que ainda ignoramos, pode acontecer de, em vez de se desmanchar, o plasma de partículas ser acelerado e expulso do Sol na forma de uma explosão, que os autores de língua inglesa chamam de flare (refulgência, fulguração, clarão), porque a região emite grande quantidade de radiação em um intervalo de tempo muito curto," completou.
Em português, normalmente utiliza-se o termo erupção solar para descrever o fenômeno.
Para ter ideia da magnitude da ocorrência, basta considerar que o número de partículas envolvidas em uma explosão solar é estimado em 1030 (o algarismo 1 seguido de 30 zeros, isto é, mil bilhões de bilhões de bilhões).
Microagrupamento
As radiações eletromagnéticas geradas pelas explosões solares são estudadas desde os anos 1950. Os estudiosos, no entanto, haviam identificado apenas radiações nas faixas de frequência do rádio e das micro-ondas.
Há cerca de uma década, porém, graças a um radiotelescópio brasileiro instalado nos Andes argentinos, descobriu-se que as explosões emitiam também radiação em frequências bem mais altas, próximas ao infravermelho distante, também conhecida como faixa terahertz.
"Isso trouxe um grande problema de interpretação", comentou Kaufmann. "Para explicar esse tipo de emissão, simultânea às emissões em rádio na faixa de micro-ondas, estamos propondo agora a analogia com a radiação síncrotron coerente, previamente observada nos aceleradores de partículas."
A explicação considera a possibilidade de os elétrons se aglutinarem com estados similares de energia e fase - o que pode ser causado, por exemplo, quando o feixe de elétrons se propaga por regiões afetadas por campos magnéticos irregulares. "Os aglomerados de elétrons podem, então, emitir subitamente radiação sincrotrônica em conjunto, de forma coerente. O fenômeno é denominado microbunching [microagrupamento]", informou o pesquisador.
"Nas regiões solares em que acontecem as explosões, os campos magnéticos são muito complexos e podem perfeitamente dar origem a aglomerados de elétrons semelhantes aos detectados nos laboratórios", disse o pesquisador.